quinta-feira, 5 de maio de 2011

A culpa de Baco e outras histórias




Chovia naquela tarde de maio e entrei na livraria. Sentei, veio o garçon. Pedi uma torta de camarão e um suco de abacaxi com hortelã... e um copo de gelo extra, que eu tenho essa mania de mastigar gelo. Dos livros que tinha acabado de escolher, resolvi começar com o de viagens... Comecei a folhear...




- Posso sentar com você?




Hummm... tava meio cheio o café da livraria e eu com duas cadeiras sobrando...fora a que acomedei minha bolsa extra grande. Sem nem levantar os olhos respondi...




- Claro, fique à vontade... (E continuei lendo...)




- Esse livro parece muito bom...




Levantei os olhos, porque finalmente reconheci a voz... era "Ele"!




- Ah, é você!!! Que coisa boa te encontrar!!!




- Pois é... achei mesmo que não tivesse me visto... não me viu no corredor de viagens, ao seu lado?




A livraria é na verdade uma mega store... e eu sou a pessoa mais desligada do mundo... principalmente quando estou concentrada... não tinha visto "Ele", porque se tivesse... bom, continuemos...




- Ah, desculpe... é que certas coisas me relaxam a tal ponto, que meio que me desconecto, sabe? Fico absorta...




- Percebi... e foi muito interessante te observar... escolhendo os livros... realmente parecendo estar "desconectada" daqui...




- Você não imagina o quanto...




Meu pedido chegou... Ele ia fazer o pedido dele.




- Você tomaria um vinho comigo...




- Hummmm... depois desse suco nem sei se vai ter espaço...




E "Ele" virando-se pro garçom...




- Dois vinhos...

E o garçom:


- Tinto ou brnaco?




E eu : branco




E ele : tinto




Parei um pouco de ficar assim tão distante e me concentrei nele. Realmente ele era um homem muito atraente. Um pouco mais jovem que eu, mas isso não fazia a menos diferença. Nos conhecíamos há cerca de dois meses e em todas as vezes que nos encontrávamos era sempre muito bom. Sentia falta de um momento em que não tivésemos tanta gente conhecida por perto, e ali, na livraria do shopping, mesmo cheia, éramos dois desconhecidos para os demais. Ficamos assim alguns minutos... calados e olhando um pro outro... Mas era um silêncio que valia por milhões de palavras... em que ambos tínhamos um ar de riso... como se estivéssemos nos medindo mutuamente... e aquilo era muito gostoso... e excitante...








O vinho chegou... ele ergeu a taça...




- Um brinde ao nosso encontro...




- Aos livros!




- A nós...




- A nós ...




É, alguma coisa estava acontecendo ali. Apesar de eu gostar dele de verdade e estar amando tudo aquilo, meio que disfarçava... inda mais agora que tinha acontecido "aquilo"... E agora? Conto ou não conto? O vinho fez efeito muito rápido em mim, que não estou acostumada a beber e não tenho nenhuma resitência ao álcool...




- Você gosta de jogar?




- Jogar, Tinny? Que tipo de jogo?




- Ah, jogo da verdade!! (Disse eu com um sorriso descaradamente malicioso)




-Ah... quando criança... hoje não mais...




- Acho que nunca deveríamos deixar nossas crianças internas de lado... com suas peraltices, inocências...




- Isso me parece um tanto ingênuo...




- Mas é... não quero perder isso... nem soterrar os sentimentos em nome dos padrões, das regas que instituiram para nós... entende?




- Regras?




- Sim... já pensou em como estamos sujeitos a todas as regras sociais... que muitas vezes nem concordamos... mas enfim...




- (Rindo) Gosto das suas idéias...




- Eu de ... (Eita que quase quem me declarava!! Dei uma pausa breve e continuei) tudo que você diz...




- É mesmo?




- É sim... agora tem uma coisa que fica completamente diferente na sua fala... no seu tom... Uma coisa é quando estamos conversando informalmente... seu tom é macio... chega a ser sedutor (e fiz um meneio com a cabeça) e outra é quando você está lendo parte de um texto ou explicando alguma coisa... aí sua voz fica mais grave...




- Vou prestar atenção nisso...não percebo claramente essa diferença... Como você acha melhor?




- Ah, o tom sedutor claro!!




- Mas eu não sou sedutor! Disse em tom mais sedutor ainda.




- Ah, é sim... talvez não propositadamente... mas naturalmente... acredite... oipinião de mulher...




Ele se limitou a rir. Terminamos o vinho.




- Tem um lugar novo aqui... só de vinhos.... vamos continuar nosso papo lá?




- Vamos... claro...




Veio o garçom, a conta... ele foi cavalheiro e quis pagar tudo... eu disse que não... ele insitiu... eu deixei... mas avisando...




- A próxima conta é minha então...




- Vamos ver...




Saímos conversando animadamente... e eu não vi mais ninguém... nem as lojas... nem nada...só via ele... O bar de vinhos é lugar é bem aconchegante e aquela hora estava semi vazio. Recebemos as cartas de vinho do garçom...




- Adoro espumante, sabia?




- Dizem que não é vinho...




- É... mas para mim as coisas ditas por mim e minhas preferências tem mais valor... Um punhado de enólogos não pode definir meu prazer em determinado sabor, não acha?




- Acho... Que tal esse? (Era um espumante italiano)




- Adoro... tá ótimo...




Agora, mais efeito de vinho na cabeça do que qualquer outra coisa, eu queria contar os meus segredos e fazer juras de amor... e claro... eu queria prová-lo... sorvê-lo, como sorvia o vinho... Mas estava ali... controladíssima...




- Eu queria saber mais de você... de sua história...




- Ah... passado, presente ou futuro? Sou muito boa nessas coisas de histórias... Um dia como hoje, talvez toda minha história seja cor de rosa, viu? Mas tem uma coisa que não contei pra ninguém ainda e quero que você seja o primeiro a saber...




- É mesmo? Um segredo? Disse ele rindo.




- É... mas antes de te contar, preciso saber uma coisa ... E preciso que você seja absolutamente sincero comigo... Você gosta de mim? (Falei...na lata!)




Ele me olhou... e eu não sei dizer se o seu olhar dizia sim ou não... porque tanto que eu queria que dissesse sim que não perceberia o contrário nunca...




- Claro que eu gosto de você...você é uma mulher muito especial pra mim... e não faço nenhum esforço pra gostar de você... é natural...temos muitas afinidades... somos amigos...




- Pois bem...também gosto muito de você... Estamos construindo mesmo uma amizade....que espero que seja profunda e duradoura... Mas eu vou reformular a pergunta... Você gosta de mim como mulher ou como amiga somente?




- Nossa, que pergunta é essa? Você acha mesmo que esse assunto é melhor delineado assim... de forma tão direta...




- Acho, sabe por que? Porque assim não haverá dúvidas para mim. Eu posso estar confundindo as coisas e prefiro jogar aberto...




- Tinny, eu sou casado...




- E daí? Isso por acaso é uma doença sem cura? Uma sentença de morte? Por acaso você deixa de ter interesse por outras pessoas porque casou? Acho que essas são as tais regras que sempre cito....As pessoas casam e estabelcem um pacto de fidelidade que não cumprem ou não desejam cumprir... fidelidade para mim não é uma coisa imposta... é algo que tem que ser verdadeiramente vivido... com liberdade... fidelidade pramim é sinônimo de felcidade...e ausência de "frestas"... Acho que se você fosse completamente feliz nesse seu casamento não estaria aqui agora... curtindo estar aqui... Não apenas porque é meu amigo... mas porque é homem... e porque gosta do que de certa forma temos... mesmo sendo uma coisa tão., tão...platônica!




- Frestas? me fala mais disso...

- Seguinte, quando temos frestas, nos nossos desejos, nas nossas relações, deixamos entrar novas pessoas... Imagine que seu coração é um quarto vedado e completamente escuro... Aí, por algum motivo, vão surgindo buracos nele...e há luz lá fora... essa luz vai entrar pelas frestas...e mesmo que sejam pequenas em relação ao escuro, vão trazer algo novo... Mas o problema é se estas frestas forem constantes... Porque aí, você nunca estará completamente satisfeito... entende?


- Entendi... mas nem toda relação extra é um "luz" num coração escuro! Então, tenho uma relação estável... não pretendo sair dela... Na verdade não tenho motivos para...




- Ter uma amante?




- Não é bem isso... mas sim, digamos que eu não queira te magoar...




- Não me magoaria nunca! Eu já entendi... se estivesse envolvido, não pensaria com tanta clareza nem separaria tanto as coisas... Ótimo... continuemos amigos... Eu precisava saber... pois estava disposta a deixar o meu sentimento por você crescer... vou tentar controlar isso... Pra você que não sente nada do que eu sinto é bem mais fácil...




- Não é bem assim... Eu também estou confuso agora... Eu penso em você também... Mas... e minha família?




- Acho que os sentimentos podem ser renovados... fazemos escolhas o tempo todo e o tempo todo mudamos de idéia... só pra simplificar... a medida do casamento para mim deveria ser a felicidade! Enqaunto você estivesse feliz de verdade, por estar com aquela pessoa ali, deveria continuar casado... quando essa felicidade fosse substituída por outros sentimentos e outras conveniências, as pessoas deveriam ter a decência de acabar a relação e se dar ao prazer de serem livres... pra começar de novo, se fosse o caso... mas viverem com felicidade, entende?




- Nem sempre é tão simples assim...eu não estou infeliz... existem outras coisas... Afinal, o que é felicidade?




- Existem... mas eu aindo sustento a idéia que não é a "instituição casamento" que deve ser algema que te prende, entende? Que devemos estar com alguém porque realmente escolhemos isso diarimaente e não há um tempo atrás, quando nossos sentimentos eram outros...e a pessoa também (rindo) E afinal, o que pé felicidade? O que é pra mim pode não ser pra você? Mas não é isso que buscamos eternamente?




- É, realmente a rotina, o tempo, tudo isso muda as pessoas... e vamos perdendo o encantamento...




- Mas aí, é tão cômodo se manter assim, né? Muitas mulheres se apavoram só em pensar em ficarem sós ao se separarem... e muitos homens levam uma vida dupla sem nenhuma culpa...




- Eu já fiz isso...




- Teve uma amante?




- Sim...




- E não deu certo?




- Nem poderia...vivíamos nos escondendo em móteis... ficou muito no sexo... enquanto era novidade...




- É isso... é preciso separar paixão de sentimento de verdade... Não acho que você tem que jogar fora uma construção de família na primeira paixão que aparece... não é isso... Mas acho que tem que estar muito feliz sim, ao longo de toda sua vida conjugal... Talvez eu seja uma idealista romãntica... Uma miga disse que também tenho uma visão romanceada do sexo... Mas enfim, eu só achoq ue temos essa obrigação...de estarmos plenos...felizes... e Nãoé o nosso par o responsável por isso... Isso não! Somos nós... nas pequenas coisas...mas se temos alguém e isso de alguma coisa nos priva dos pequenos prazeres, das pequenas alegrias, ou mesmo se cerceia nossa liberdade, aí, pra mim, somo infelizes... e presos..l




- Não estou vivendo necessariamente isso que você tá dizendo... Mas entendo onde quer chegar...Você é uma mulher fantástica...gostaria de ter te conhecido antes...




- Mas aí eu também seria casada...e agora sou livre... e a liberdade é uma questão de limites...que você se dá...ou que te dão... ou que você acha que te dão... enfim... Amigos?




E dei a mão para ele apertar... ele pegou minha mão e beijou demoradamente... aquilo me provocou uma onda de calor indescritível... realmente eu gostava dele de um jeito diferente...pensava nele a longo prazo e nas muitas coisas boas que poderíamso fazer juntos... e definitivamente não queria uma aventura... Já que ele se mantinha na defensiva, melhor deixar correr solto... Dali em diante nem mais uma palavra sobre o assunto... queria preservar amizade, mas não sei se ele saberia lidar com isso...




- Bom, acho melhor eu ir...




- Não... vamos tomar mais um vinho?




- Rapaz, depois de tudo isso eu não respondo por mim, heim? Vai querer correr o risco? Com mais vinho eu devo ficar uma verdadeira bacante... liberto o "verdadeiro eu"... Vou questionar a vida, o ser , o prazer e a felicidade!!!




- Pensei que estivesse frente a frente com seu "verdadeiro eu"... (rindo)




- E está... mas você bem sabe de como controlamos o que dizemos... não necessariamente o que fazemos e muito menos o que pensamos... Aliás, queria poder viver num mundo sem comunicação oral... só com o pensamento... Já pensou, que maravilha?




- Um tanto perigoso... porque não dá pra refrear os pensamentos...




- Mas acho que somos livres no pensamento justamente porque não tememos o julgamento alheio, né??




- Não sei... (O vinho chegou... e dessa vez era tinto)




Três taças depois... muitas risadas... alguns toques propositais das nossas pernas embaixo da mesa, "Ele" vem sentar ao meu lado... Olha pra mim com tanto carinho... tanto enlevo... isso é muito irresistível... e eu estou naquele último momento de lucidez... E eu tenho duas opções:




1- A gente se beija... e é muiiiiiiiiiiiito bom... tão bom que saímos de lá de mãos dadas, pouco ligando pro mundo lá fora... como dois adolescentes apaixonados... só temos olhos um pro outro...




2- A gente não se beija... reprime aquele autêntico desejo... e foge do que seria um momento de completude...








Eu ainda não decidi qual o rumo dos pombinhos ali... então vou ficar por aqui... quem sabe não os retomo outro dia... Ah, e o segredo que ela ia contar pra ele, você sabe qual é??? Esse eu sei... e mudaria muita coisa na história.... vá tentando descobrir...








Até mais,








Guel








salvador, 05;05/11 16h 42min
































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