sábado, 17 de junho de 2017

Os tijolos da espontaneidade e a argamassa técnica

Tou fazendo na UFBA a disciplina Jogos e improvisação Teatral (TEAA15).
Temos 8 aulas semanais, divididas em três dias e muita atividade prática. Uma das atividades escritas é a elaboração de um relatório semanal sobre as percepções e sensações da aula. Eu já fiz quatro e eles ficaram tão íntimos e evidenciando os meus estados de espírito, que acho que tá mais pro muro das lamentações. Só eu e Meran vamos entender essa metáfora, afinal é uma experiência de escrita muito peculiar.

Mas dá um click no muro do Pink Floyd pra ficar mais legal de ler. Eles criticam a educação formal com suas regras e controles. Eu também! Então, é preciso de um pouco de semiótica nessa vida!


Mas eu acho que é necessário outro estilo de escrita para mim, que tenho blog e gosto de escrever. Primeiro que o hipertexto me atrai mais. Segundo, que eu preciso estar com a mente em movimento. Aliás, se meu corpo fosse tão ativo quanto minha mente, eu seria muito "malhada".

Tabém tenho necessidade aprofundar o conhecimento de como ensinar a técnica na prática, afinal, como futura Diretora Teatral, quero desenvolver minha própria metodologia.

Na narrativa um tanto monótona, porém bem didática e básica, o vídeo "Viola Spolin vida e obra" traz um pouco da história desta importante autora, professora e implementadora dos Jogos Teatrais nos Estados Unidos. Ela se baseou no trabalho de Neva Boyd, e seu trabalho é fascinante. Também gosto da Ingrid Koudela, que foi para além da tradução de Spolin e da criação da  Revista Fênix. Esse trio feminino, em difrentes momentos, trouxeram valiosas contribuições para o teatro improvisacional.

Gosto de Spolin com seu estilo próprio e já li alguns de seus livros. Sua linguagem é simples, direta e objetiva. Beirando o coloquial, no entanto. Ela acredita na espontaneidade e a defende, de forma  que o jogador deve estar concentrado na ação com o objetivo de liberar a energia a partir de "liberdade pessoal" que pode ser estimulada e fazer com que o jogador "transcenda a si mesmo", tornando-se capaz de:
[...] penetrar no ambiente, explorar, aventurar e enfrentar sem medo todos os perigos. A energia liberada para resolver o problema, sendo restringida pelas regras do jogo e estabelecida pela decisão grupal, cria uma explosão – ou espontaneidade – e, como é comum nas explosões, tudo é destruído, rearranjado, desbloqueado. (SPOLIN, 1998, p.5)


Fig. 1 -  A brecha nas regras. Calvin & Haroldo, by Bill Watterson. Fonte: http://depositodocalvin.blogspot.com.br/

Na minha prática, isso não acontece assim, como se fosse a lei da gravidade. Os exercícios de aquecimento podem até exigir a minha atenção e pelo caráter lúdico contribuir para o meu envolvimento pessoal na atividade, no entanto, essa explosão que vem e desbloqueia as coisas não é fruto de uma ação física. Ou pelo menos não foi até agora. Eu fico orbitando em mim mesma e em meus pensamentos. Se os exercícios são de relaxamento, eu divago, entrego o corpo à malemolência e só. E aí fico questionando se não estou atingindo os objetivos propostos, daí querer compreendê-los melhor.

Defendi recentemente o meu interesse em entender a técnica, o processo, o objetivo e a intencionalidade. Claro que não vai existir uma receita e eu não quero isso. Mas sinto falta, devido ao meus estilo ainda calcado nas hard sciencesda teoria que subsidia as coisas. Porque tem teoria na prática e vice-versa... para mim. Me senti um pouco "catequizada" por alguns colegas, como se estivesse buscando o Santo Graal


Fig, 2 - Minha dúvida também. Fonte : http://www.antigomoodle.ufba.br/file.php/11455/To_blog_or_not.jpg

Em teatro, alguns autores tem uma certa "desconfiança" para com a técnica. Encontrei um artigo  de Thomas Holesgrove e aproveitei bastante. Confesso que ler artigos é bacana para mim. Ele tece uma interessante costura entre Técnica e Espontaneidade a partir uma comparação das obras de Jerzy Grotowski, Viola Spolin e Kristin Linklater. Acho apud um negócio feio no texto, daí tou referenciando como lido na fonte, mas confessando que li no artigo, tá?

Não educamos um ator, em nosso teatro, ensinando-lhe alguma coisa: tentamos eliminar a resistência de seu organismo a este processo psíquico. O resultado é a eliminação do lapso de tempo entre o impulso interior e a reação exterior, de modo que o impulso se torna já uma reação exterior...Nosso caminho é uma “via negativa”, não uma coleção de técnicas, e sim erradicação de bloqueios. (Grotowski, 1992, p.14-15)

Será que estou bloqueada? E se estou, qual a chave de acesso para o desbloqueio? Tenho obrigação de saber? Me senti um celular agora... Com toda potencialidade mas sem saber utilizar as interfaces. A quem se recorre nesses casos? Ao manual, claro! Mas eu não sou uma máquina, embora não esteja destituída de tecnologia!


Fig, 3 - O palco não é pra você. By Pedro Ivo. Fonte: https://pedroivo.files.wordpress.com/2014/05/teatro.jpg

Noto que Grotowski faz distinção (neste trecho) entre educar e ensinar. São sinônimos, no entanto. Acredito que educar é maior ensinar. Se se é essa sua intenção, talvez seja ancorada também na ideia de que "no teatro é diferente", como ouvi tantas vezes. Que diferencial é esse?

Já Spolin, me fez pensar no talento versus a técnica,  que dá outra discussão e não quero fazer um post/relatório gigante!

As técnicas não são artifícios mecânicos – um saco de truques bem rotulados para serem retirados pelo ator quando necessário. Quando a forma de uma arte se torna estática, essas “técnicas” isoladas, que se presume constituam a forma, estão sendo ensinadas e incorporadas rigidamente. (Spolin, 1998, p.12)

E temos também trabalhado a voz. Gostei das considerações que apontam para o aprisionamento da voz e portanto da espontaneidade. Ninguém vai dizer que um cantor não precisa de técnica, vai?  Mas reconheço que intuição é fundamental no processo criativo! Acho que nessa vibe, os exercicios em que começamos a trabalhar os cinco elementos da voz. Começamos com a voz terra, assim como no vídeo de Bárbara Macafee. (OH NO!!!)

O processo é estruturado para liberar a voz natural em vez de desenvolver uma técnica vocal. [...] A ênfase aqui é de remover bloqueios que restringem o instrumento humano como algo diferente do que o desenvolvimento de um instrumento musical habilidoso. (Linklater, 1976, p. 1)

O que mais fizemos e que não citei aqui foram variações do jogo que descobri se chamar Samurai. Também fizemos o Jogo do Pêndulo e surpreendentemente eu me deixar conduzir. Meu temor era ser pesada demais para meus colegas magrinhos!

Enfim encontrei teoria para a necessidade de repetição que eu acho pouco atraente. Mas eu entendo! Mas eu preciso entender com um suporte, discordando, ampliando, comparando. 

Espero que esse texto seja útil não apenas para mim. Daí, aqui está! É um importante momento de reflexão crítica e que me servirá posteriormente também.

Guel Pinna

Salvador, 17.06.17  11:36h


Referências

HOLESGROVE, T. Técnica e Espontaneidade: uma comparação das obras de Jerzy Grotowski, Viola Spolin e Kristin Linklater. Revista Aspas. vol. 2, n.1, dez. 2012, p. 141-150. Disponível em:
Acesso em 17. jun, 2017.


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