quinta-feira, 24 de julho de 2014

A Menina e a Pedra

A Menina e a Pedra

Capítulo I

Acordei em frente a Pedra. Eu estava na minha prainha em Olinda, a poucos metros de casa. Mas nada existia mais. Só a pequena faixa de terra e a enorme rocha com face meio humana que ficava dividindo o meu espaço e o mar.

Eu chorava por estar assim tão só. Longe de toda civilização que eu sabia estar atrás daquela barreira. Eu nem tentei escalar, pois a parede rochosa era lisa, e altíssima, e fechava meu pequeno lugar. Eu tinha seis anos e esse pesadelo me atormentava constantemente.

Hoje eu compreendo esse sonho como o desafio precoce que eu sempre tive de me sentir um pouco diferente. Claro que ninguém é igual a ninguém, mas eu sempre disse que não me sentia muito "daqui", sabe? E hoje sei que realmente não somos de onde nascemos... Somos de um lugar muito maior.

Eu achava que tinha superpoderes e controlava o vento. O vento sorria quando eu cantava e vi muitos redemoinhos girando as coisas do chão. Eu sempre achei que era por mim que o vento fazia isso... Eu tinha sete anos...

Eu também gostava de ir num campinho catar ovos de lagartixa. E os jogava no chão pra ver eles pularem, como se fossem de borracha. Eu não sabia que estava condenando as novas lagartixinhas que queriam nascer. Aliás, eu nunca gostei de matar nada, nem barata... Mas a gente vai crescendo e acha que pode matar todos os animais. Pra comer, pra se livrar deles... E quando eu tratei uma galinha pela primeira vez, eu achei um absurdo estar "esquartejando" um animal... Mas eu cresci num ambiente onde todos comiam carne e sempre achei natural que fosse assim... Mas isso será mesmo o natural? Com tantas outras opções de alimentos e sem nenhum fator de sobrevivência nos ameaçando, precisamos mesmo criar para matar os animais de "corte"?

A Pedra sempre esteve presente... A me separar de seres que eu comecei a retratar como "Habitantes de Orion" em telas que não sei onde andam... Sempre foram mulheres e a que eu mais gostava tinha uma cobra enrolada no pescoço... Vou repintar essa tela... Tinha uma anjo grávida...Vou refazer...

Hoje eu sei que a "menina" que eu nunca sufoquei dentro de minha "capa" de adulta é muito forte e tem uma personalidade cada vez mais peculiar. Como podemos ser adultos e resguardar dentro da gente o que tínhamos de melhor quando éramos simples e inocentes?

A menina conversou com a Pedra num dos meus roteiros mais simbólicos e complexos... E nele, a Pedra era do bem e estava também encantada e presa dentro de minha prisão... Será nossa prisão a mente? Ou será o ego? Ou mesmo o coração?

A menina que falava com o vento e fazia redemoinhos pra se divertir cresceu, aparentemente. Mas ainda chora, sofre e sente a falta de seus queridos entes... Por favor, não se escondam de mim...

Guel  Pinna

Catu, 24/07/14 21:57h

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